by Ana

Um espaço para partilhar as "tolices" de cada dia, de uma forma descontraída, descomprometida e com algum sentido de humor. Only that.

domingo, 14 de março de 2010

Papazito

Quando era miúda aprendi uma canção que era assim:
"Papazito já te tenho dito que não é bonito andares a enganar-me
Papazito já te tenho dito que não é bonito andares a enganar-me
Chora agora papazito chora que me vou embora pra não mais voltar
Chora agora papazito chora que me vou embora pra não mais voltar"

Lembro de a repetir vezes sem conta, a modos de desafio, escondida atrás de um canto ou de um cortinado, nos poucos momentos que via o meu pai em casa.
O meu pai sempre foi uma referência para mim. Sempre foi uma pessoa que eu admirei, se calhar pelos altos e baixos, sobretudo pelas vezes que caiu e que se reergueu ao longo dos seus sessenta e sete anos de idade. Não o quero comparar aos meus avós, seus pais. Não quero, nem posso. Mas o meu pai é o meu papá. Até hoje. Tenho 45 anos e ele continua a ser o papá.
Um destes dias telefonei-lhe (já não me lembro bem a propósito do quê) e perguntei-lhe, disfarçando a voz: papá, sabes quem fala? Ele respondeu, “claro que sei! Tenho quatro filhos, mas só um é que me trata por papá!”
Os meus amigos riem-se quando me ouvem atender-lhe o telefone: “ Sim, Papá”. Mas eu não me importo. É o meu papá, sim. Nos últimos três/quatro anos da minha vida, devo-lhe mais ternura, preocupações e carinho do que uma criança de três anos deve ao seu papá. Está sempre presente. Incondicionalmente a meu lado. Silenciosamente, mas a meu lado. Sofre as minhas dores e ainda sofre mais do que se eu tivesse cinco anos, porque as dores aos 45 são maiores do que aos 5 e ele sente isso. Maiores e parece que se multiplicam da noite para o dia. E também são maiores para uma papá de 67 anos do que para um papá de 25 anos, a quem já lhe faltam as forças e já lhe sobram os desgostos e o cansaço de uma vida, vivida num compasso de ritmo composto e um andamento entre o grave e o prestíssimo, passando por um alegro de quando em vez, numa panóplia de tonalidades que abrange do Dó menor ao Sol maior.
Recorda outros tempos, os tempos em que eu tinha cinco anos e ele vinte e cinco ou vinte e seis; os tempos em que os meus avós também estavam presentes e as dores eram repartidas por uma família; os tempos em que as dores eram outras e em que ele não era o “chefe” de quem se esperava o impossível, em que ele não era o pai de uma família, o responsável máximo e ao mesmo tempo o bicho papão, o monstro das bolachas, era apenas o papazito.
Para mim será sempre assim, o meu papá. O maestro da orquestra de um andamento Vivace de uma Valsa em Sol maior, aquela do:
"Papazito já te tenho dito que nunca me enganaste.
Não chores papazito que eu nunca me irei embora para não mais voltar. "
Amo-te muito, papá.

10 comentários:

  1. Antecipaste o Dia do Pai... Gostei muito!
    Bjs

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  2. Olá, Nando
    Não antecipei o dia do Pai. Prestei uma homenagem devida a uma pessoa, que por acaso é meu pai. Um grande amigo e um grande Homem.
    Obrigada pelo teu comentário
    Bj

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  3. Ana,
    Uma homenagem lindíssima ao teu Pai.
    Dá-lhe muito mais. O teu amor, a tua presença... a tua presença (sabes do que falo).
    Beijo com muita luz e paz

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  4. Ana

    Eu tenho 42 anos e perdi o meu pai vai fazer 12, ainda doí!
    O meu pai era, é, uma referência de vida para mim, um homem digno, corajoso, trabalhador e de princípios, para além disso o meu melhor amigo de sempre, parecidos fisicamente temos ainda a mesma forma de entender o mundo, os mesmos olhos, lábios e tom de pele, o mesmo andar desengonçado, o mesmo sentido de humor por vezes cáustico, o carro cheio de lixo...partilhamos ainda o amor da musica, do cinema, aprendi com ele que nos faz muito mais falta um livro que uma camisola.
    Também conheço a música, mas cantava a começar Joselito já te tenho dito...e foi o meu pai que me ensinou, claro.

    beijo

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  5. Angels
    Ao meu pai darei tudo quanto estiver ao meu alcance. Lamento as preocupações que também lhe dou, enquanto filha, mas tudo farei para que ele nunca conheça o desconforto de um lar ou de "uma casa de repouso".
    Bj

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  6. Ana,
    Nem quero pensar em perder o meu pai.
    Tb eu sou muito parecida com o meu, para o bem e para o mal. Não há doença que não tenha "herdado" dele..., literalmente!!
    Tb a forma de entender o mundo. A cumplicidade. Temos vinte anos de diferença, pelo que hoje, em determinados assuntos, somos como que dois irmãos, entendes? Não sei que seria de mim sem aquele colosso.
    Bj

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  7. GOSTEI DE TE LER...A AMIZADE AO PAPÁ É MUITO BONITA E TERNURENTA...UMA CUMPLICIDADE QUE TE ANIMA...E ISSO É O QUE VERDADEIRAMENTE INTERESSA.

    QUE SEJAM ASSIM POR MUITO TEMPO..."AMIGOS PARA SEMPRE"

    O FUNCHAL ESTÁ A RECONSTRUIR-SE A OLHOS VISTOS...É O SINAL DE QUE A VIDA CONTINUA...APESAR DA DOR DAQUELES QUE FICARAM SEM OS SEUS BENS E SEM FAMÍLIA...HÁ DORES QUE NÃO SE APAGAM POR DINHEIRO NENHUM DESTE MUNDO...

    BEIJINHOS

    ATÉ LÁ

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  8. Obrigada, Pedras
    É de facto uma grande amizade.
    Bj e força.
    Ana

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  9. Compreendo-te muito bem. O meu pai também é para mim muito especial, e é a pessoa que nunca me falhou, na minha vida.
    Que bom termos papás assim!
    Bjs

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  10. Tens razão, Teresa. è uma benção de Deus termos pais assim. Bj

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Olá, então diga lá de sua justiça...