by Ana

Um espaço para partilhar as "tolices" de cada dia, de uma forma descontraída, descomprometida e com algum sentido de humor. Only that.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

O meu amigo novo

Embora não pareça sou uma pessoa pouco dada a novas amizades. Gosto de rir, de brincar, mas isto de amizades, amizades a sério, daquelas que entranham o nosso coração e dominam o nosso pensamento, tem muito que se lhe diga. Poucas, mas boas e escolhidas a dedo.Sobretudo discretas, nada de espalhafatos, de encrencas, de talk-shows, de big brothers,...
Mas reconheço que até aqui a idade tem os seus truques e faz das suas partidinhas.
Ontem, foi dia se Santo Ordenado, dia de pôr as contas em dia, pois, mesmo não sendo eu PR, o meu salário é do tipo "ejaculação precoce": ainda agora entrou e já acabou. Dia santo, cumpri a solene tradição e lá me dirigi à caixa MB do Fórum, munida das papeladas das contas mensais para colocar em dia e zás. Uma, duas... à terceira foi a vez do carregamento do telemóvel.
Digitava 91 quando o meu amigo novo começou a matraquear-me uns números 63, 86, ... Às tantas, mensagem da ATM: referência inválida (valha-nos a Vodafone ser honesta!)
Ok, second round, recomeço, insiro cartão, pin do cartão,  91 e começa outra vez o meu amigo, agora em sequências de 3 algarismos, enquanto eu digitava, ele buzinava-me 663, 839, e a ATM: referência inválida!
Ai a chatice! Olho para trás, disfarço um sorriso e entre dentes explico, para a fila,  que se trata de um problema com o número do telemóvel. Eis que o terceiro cavalheiro, já grisalho, que deveria querer ser meu amigo também, propõe logo a solução: "a Srª telefone aqui para o meu topo de gama da quinta geração que acusa o seu nº e ficamos todos com o problema resolvido" (e ele com o meu nº para poder ser meu amigo, ora bem...)
Lá lhe explico que o meu plano de carregamento é daquelas coisas extraordinariamente mirabolantes para roubar dinheiro legalmente e à descarada e que, embora seja das poucas coisas na minha conta corrente que tenha um saldo largamente positivo ao fim do mês, quando chega ao dia do Santo, ou carrego ou a Vodafone corta-lhe o pio. Finish. No parla più.
Assim, puxo do dito, percorro a agenda nos A, à procura de uma Ana que me soasse a EU, mas Anas há muitas, nenhuma era EU. Tv em E de EU, mas nada, rien de rien. Lembrei-me então de V, de Vodafone. Rapidamente dei um pulo ao fim da lista, mas nos V, só um Veneno Branco, também 91 e que, diga-se de passagem, com este nome não pode interessar a ninguém!
E a fila crescia, crescia, mas eu sem telemóvel, não podia ficar. E o meu amigo continuava... é 91 663, não, 9163389...
Pego na minha moleskyne, onde tenho as passwords da escola para a direção de turma - justificação de faltas-, para a direção de turma - níveis-, para os níveis de professora, sem ser diretora de turma, para as impressões e fotocópias, para os sumários, os nibs das contas bancárias dos meus três filhos - para as transferências urgentes às três da madrugada- , as datas de nascimento dos meus namoricos todos, pois não quero esquecer estas coisas, e procuro, avidamente, um EU  Vodafone. NADA!
Às duas por três, olho para os olhos dos outros que já não queriam ser meus amigos, para as mãos nas ancas das senhoras que nunca pensaram ser minhas amigas e fui à Vodafone.
Lá chegada, viro-me para o meu amigo novo e disse-lhe:
"Oh Alzheimer, diz lá agora qual é o nº do meu telemóvel que a ATM não aceita"

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O acordo tripartido e o meu avô João

O meu avô nasceu nos princípios de 1897, chamou-se João e, definitivamente, não era cobarde.
O meu avô João contava-me histórias, passadas em dois séculos diferentes, desde que eu tenho memória de mim. 
Contou-me a história da Aldegalega (que hoje se chama Montijo), mas também a história da vida dele, dos tempos em que ainda quase não havia carros e por isso ele tornou-se um carroceiro de renome. E a conduzir a sua carroça o conheci, toda a vida. Não porque as Novas Oportunidades da altura não lhe tivessem validado os seus conhecimentos de código da estrada e controle de freio, mas por que ele assim o entendeu.
O meu avô João tinha 20 anos quando teve a coragem de desertar das fileiras do Corpo Expedicionário Português e assim, talvez, escapar à fileira da morte na batalha de La Lys.
Ao que ele não conseguiu escapar foi ao que se seguiu nos vinte anos seguintes e, diga-se de passagem, constituiu o melhor repertório de histórias que eu alguma vez já ouvi.
A sua condição de desertor, à época, obrigou-o a viver até aos 40 anos nesta minúscula Aldegalega de uma forma que em tudo se assemelhava ao modo como eu ouvia os meus professores de história descreverem a época feudal e as relações entre o senhores feudais e o seus servos.
Não falando da vida privada, pois é aqui que entra uma Elvira que até o Corpo Expedicionário era capaz de empurrar com a barriga, as relações laborais durante aqueles vinte anos resumiam-se ao que o patrão queria, quando queria, como queria.
"E quando fui apanhado a roubar um morango do morangueiro, para comer, descontou-me a semanada."
"Oh avô, e o que é que tu fazias?"
"Viviamos numa ditadura, Tininha e eu era um desertor. Nada podia fazer."
Ontem, ao ler as gordas do acordo tripartido, lembrei-me do meu avô que se chamou João, nasceu em 1897 e não era cobarde, da ditadura e dos desertores.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

A evitar

Há  coisas que não podemos evitar...
Não podemos evitar pertencer à família em que nascemos;
Não podemos evitar gramar o governo e o pr que a maioria de entre a minoria dos tugas que foram às urnas escolheu por bem votar;
Não podemos evitar conviver para o resto da nossa vida com a cicatriz daquela borbulha chata que ficou como marca da passagem pela adolescência;
Não podemos evitar sentirmo-nos gregos, embora tenham sido os romanos, os franceses, os ingleses que por cá andaram;
Não podemos evitar o desdém de estimação por aquela equipa treinada por um que se diz Jesus, quando a nossa religião é o budismo;
Não podemos evitar  sentir simpatia por o Real Madrid, pois o que é português é bom e o CR7 mais o Mourinho são a nossa imagem de marca, apesar do pertuguês de um e da arrogância do outro;
Não podemos evitar a pandemia do facebook, num pack multusos dois em um de cusquice + auto promoção;
E, como dizia o outro, não podemos evitar que os pássaros voem por cima das nossas cabeças. Mas podemos evitar que façam ninhos no nosso cabelo. Bastará penteá-los, com afinco. (isto digo eu, claro).